terça-feira, 8 de setembro de 2015

Dá Pra Ver o Céu


“O tempo às vezes é muito amigo, muito claro
Os amigos já são raros
Mas me levam pela mão
Se perde muito tempo em busca da felicidade
Mas viver só de saudade
Nunca foi nenhuma solução..."



_ E o apartamento novo? Tá gostando?
_ Dá pra ver o céu.

Desde que mudei de cidade, milhões de coisas mudaram dentro de mim.
A começar pela minha visão das pessoas. Claro, saí de uma cidade de 70 mil habitantes para uma com 1,5 milhões de pessoas que zig-zagueiam por aí.
E quanto mais conheço pessoas, mais conheço a mim mesma.

Um fato que eu considerava irremediável é que tenho medo do escuro. Quando me deito a noite, tomada pelo cansaço e por todos os pensamentos que me atormentam, percebo que, em meio a uma cidade repleta de prédios e muros de concreto, eu consigo ver o céu. E é com ele iluminando meu quarto, que apago a luz do abajur sem temer o breu e vou dormir tranquila. Dá pra ver o céu.
Assim, alguns meses após a mudança, comecei a encarar todos os meus medos de uma forma mais leve.
Percebo que consigo ser mais corajosa e definitivamente passei a odiar pessoas muito medrosas.
E não falo só do medo do escuro, medo de violência ou fobias no geral.
Falo do medo em todas as suas formas.
Medo de cair.
Medo de subir no salto.
Medo do passado
Medo de sorrir. Medo de morrer.
Medo de assalto. Medo de se reerguer.
MEDO
Medo de quê?

De olhar nos olhos, de recomeçar.
De errar o passo e voltar a dançar.
De abraçar, cativar e depois precisar cuidar.

Se dá pra ver o céu da minha janela e encarar o antigo medo do escuro, preciso passar a ver o céu em todos os lugares por onde for. Se preciso, levá-lo comigo.

Quer que eu te mostre alguma estrela que você não consegue ver daí?

Vem Pra Cá

Ele, que tantas vezes suplicou por silêncio, ontem teve pesadelos e vagava pelo apartamento vazio às três da manhã, se incomodando com o motor da geladeira. 
Só queria ela ali. 
Ela e aquela mania idiota de rir dos defeitos dele sem nunca o deixar envergonhado. 
Ele tinha certeza de que ela riria dele naquele momento. 
E é isso que o fazia a querer ali. 
Será que ela conseguiria fazer uma mudança? Ele ajudaria a carregar as caixas. 
Ficou com saudade de dividir algumas coisas que eu só dividia com ela. 
A boca da garrafa de cerveja, o talher, o sofá, a TV, o degrau da escada, o travesseiro, a cama de solteiro. 
Enquanto vagava, ele se odiava. 
E ela iria rir tanto dele que ele se questionava o porque de se odiar assim, já que ela conseguia o fazer rir até quando estava triste. 
Ele se odiava por conta dessa mania inquieta de sempre querer ir embora dos lugares. Lembrou do dia que quis ir embora de onde morava, perguntou sua opinião e ela espondeu sem titubear um grande e belo “vem pra cá". 
Será que ainda dava tempo? 
Sabe, ela ainda o aceitaria? 
Ele sentia saudade! 
Será que precisaria vagar de novo?! Queria tanto que ela o aceitasse. 
Quanto tempo? Quis saber. Iria riscar o calendário. 
A esperava para uma visita na próxima semana. 
Mas teve medo de ainda precisar esperar mais de um mês, dois ou três. 
Teve medo de ter que esperar uma década talvez. 
Porque ele sentia uma puta vontade de ir embora de novo. 
Mas dessa vez queria ir embora de si. 
Será que ela o aceitaria?


Da janela

Nós nos apaixonamos pelo olhar.
Ele sorriu e eu retribui.
De cara já planejamos tudo: 
Eu compraria as alianças e ele alugaria nosso apartamento na Savassi.
Eu escolheria a raça do nosso cachorro e ele compraria os copos de cristal.
Eu decoraria nosso quarto e ele decidiria a cor no sofá.
Mas o sinal abriu e o ônibus dele arrancou antes que eu visse pra onde ia.
E aquela história de janelas entrou pra minha lista de casos de amor instantâneos. 


Inquietude


Tenho inquietude noturna
É de noite, no silêncio e no escuro
Que as ideias surgem, uma a uma
Já disseram diversas vezes
Tenta dormir cedo, pra não cair no sono pelas paredes!"
Não dá
O coração acelera e a mente também
O escritor em mim aproveita e aprecia
O que não há durante o dia:
O único momento em que os dois brigões entram em harmonia
Se o coração é dor, a mente cuida com o que sabe sobre amor
Se o coração é vontade, a mente concretiza com vaidade
Se o coração planta a semente
A mente [finalmente], escreve o que ele sente.